quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

Boêmios


Comecei a ler Boêmios, de Dan Franck. O livro é sobre os artistas que, no início do séc. XX, ocupavam as ruas, bares, cabarés e ateliês de Montmartre e Montparnasse, bairros parisienses que foram o epicentro das principais manifestações modernas de arte.
Picasso, Modigliani, Chagall, Gris, Apollinaire, Max Jacob, Rivera, Krogh, Matisse e tantos outros são os personagens que vivem suas loucuras e as registram por meio da arte.
*PS: Ler esse livro é uma experiência que ultrapassa todos os limites....invade todos os sentidos. Uma espécie de vício que mata a nossa vontade de transcender o cotidiano e escapar para o surreal...


"Disso resultaram algumas esquisitices que não alarmaram a família até o dia em que ele se comportou na via pública de maneira pouco decente: compreenderam então que ele era poeta". Louis Aragon

quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

Borges

"Na parte inferior do degrau, à direita, vi uma pequena esfera tornassolada, de quase intolerável fulgor. Ao princípio pensei que fosse giratória; logo compreendi que esse movimento era uma ilusão produzida pelos vertiginosos espetáculos que encerrava. O diâmetro do Aleph seria de dois ou três centímetros, mas o espaço cósmico estava aí, sem diminuição de tamanho. Cada coisa (a lua do espelho, digamos) era infinitas coisas, porque eu claramente a via de todos os pontos do universo. Vi o populoso mar, vi a aurora e a tarde, vi as multidões da América, vi uma prateada teia de aranha no centro de uma negra pirâmide, vi um labirinto roto (era Londres), vi intermináveis olhos imediatos escrutando-se em mim como em um espelho, vi todos os espelhos do planeta e nenhum me refletiu, vi em um pátio da rua Soler os mesmos ladrilhos que há trinta anos vi no saguão de uma casa em Frey Bentos, vi ramos, neve, tabaco, gretas de metal, vapor d'água, vi convexos desertos equatoriais e cada um de seus grãos de areia, vi em Inverness uma mulher que não esquecerei, vi a violenta cabeleira, o altivo corpo, vi um câncer de mama, vi um círculo de terra seca em uma calçada, onde antes houve uma árvore, vi uma chácara de Adrogué, um exemplar da primeira versão inglesa de Plínio, a de Philemont Holland, vi a um só tempo cada letra de cada página (quando criança eu costumava maravilhar-me de que as letras de um volume fechado não se misturassem e perdessem no decurso da noite), vi a noite e o dia contemporâneo, vi um pôr-do-sol em Querétaro que parecia refletir a cor de uma rosa em Bengala, vi meu dormitório sem ninguém, vi em um gabinete de Alkmaar um globo terrestre entre dois espelhos que o multiplicavam sem fim, vi cavalos de crina como um remoinho, em uma praia do Mar Cáspio na aurora, vi a delicada ossatura de uma mano, vi os sobreviventes de uma batalha enviando cartões postais, vi em uma vitrine de Mirzapur um baralho espanhol, vi as sombras oblíquas de umas samambaias no solo de uma estufa, vi tigres, êmbolos, bisontes, marejadas e exércitos, vi todas as formigas que há na terra, vi um astrolábio persa, vi em uma gaveta da escrivaninha (e a letra me fez tremer) cartas obscenas, incríveis, precisas, que Beatriz havia dirigido a Carlos Argentino, vi um adorado monumento na Chacarita, vi a relíquia atroz do que deliciosamente havia sido Beatriz Viterbo, vi a circulação do meu próprio sangue, vi a engrenagem do amor e a modificação da morte, vi o Aleph, de todos os pontos, vi no Aleph a terra, vi minha cara e minhas vísceras, vi a sua cara, e senti vertigem e chorei, porque meus olhos haviam visto esse objeto secreto e conjetural, cujo nome os homens usurpam, mas que nenhum homem jamais olhou: o inconcebível universo."

quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Irmã


Para minha irmã, Flávia: 

 Um resgate das coisas mais bobas e legais da nossa infância. Vai lembrando aí:
- Mamãe montando todo dia uma "historinha" diferente no nosso prato só pra gente animar de colocar pelo menos uma colherzinha na boca.
- A nossa casa, no meio das pedras, na Serra do Cipó, que só recebia visitas corajosas já que era uma verdadeira aventura chegar lá. Tinha que conseguir pular um monte de pedras e um riacho.
- A gente subindo no armário pra roubar "mastiguinhas" e a mamãe avisando que aquilo era remédio: "gente...vem num vidro de remédio, se fosse bala não vinha".
- As verdadeiras "torturas" que a gente fazia o papai passar. Ir comprar figurinha, trazer papel de carta pra gente, comprar revistinha, arrumar 3 maletinhas em cada vôo para dar uma pra cada um e dirigir no meio daquela confusão gigante que a gente arrumava nas viagens, sem colocar a nossa vida em risco.
- Vovó jogando aquela chuva de balas e correndo da sala, tentando tirar o meu anel de ouro que ficou "preso" no dedo da Renata, colocando você dentro do armário pra você não apanhar (e esquecendo você por lá), a gente teimando em subir a escadaria com nossos tamanquinhos fashion e sempre torcendo o pé, é claro. Todo mundo "entalado" com bala soft e o desespero da vovó.
- Tia Zezé assustando a gente de noite quando a gente ia dormir lá e ficava inventando de beber água e ir no banheiro a noite toda. Lembra daquele saco de batata?
- A gente dançando 500 mil vezes "sugar...ta na na nã...oh honey...honey" porque era o único disco que tinha na casa da tia Chiquita e ele só tinha essa música, nos dois lados!
- Papai jogando Scotland Yard com a gente, lembra? Ele devia resolver o mistério num minuto, mas fingia que não, pra gente não ficar decepcionada.
- A boneca bate-palminha que você ganhou no Natal e que não conseguia encostar uma mão na outra! Papai alí a noite inteira tentando dar um jeito.
- Todos os natais que emendavam dia e noite, com todo mundo dormindo, menos nós, fazendo test-drive em todos os brinquedos...
- A gente chegando na casa da tia Marly, cumprimentando rapidamente os meninos e indo direto ao ponto: cadê a sua coleção de playmobil?
- Papai gastando horas pra mostrar pra gente como é que ele conseguia colocar todas as cores em sequência naquele cubo, rs.
- Nossas brincadeiras de barbie naquela salona vazia na casa da Patrícia, lembra? A boate era o som, única coisa q tinha na sala. A gente brincando de ficar preso no elevador.
- O castigo de tomar banho na ducha fria da sauna quando a gente aprontava na casa da tia Chiquita. Acho que era por isso que a gente aprontava tanto.
- O dia em que eu pulei na piscina de noite, toda vestida, e fui parar na tal ducha fria.
- As nossas brigas no hotel sobre quem ia escovar os dentes primeiro.Ei, aquela camisola era nova!
- As idas na casa da Karina pra brincar e o ódio que a gente ficava dela não deixar a gente encostar em nada, em nenhum daqueles brinquedos importados!
- O desespero que a gente ficava pra achar e separar os sapatinhos e brincos da barbie depois das brincadeiras.
- Os vários álbuns de figurinhas que ficavam lá, esperando a vida inteira pelas últimas figurinhas pra ficarem completos.
- A gente "pulando" pra dentro do balcão, na Serra do Cipó, pra "roubar" chocolate Kri e soda limonada. E depois o papai: "gente, vocês comeram 30 chocolates e tomaram 20 refrigerantes? Tão doidas?"
- O corredor que a gente tinha que atravessar pra ir do hotel pra casa da tia Zélia, que sempre tinha um sapo pra gente encarar. E aquele ferro de passar roupa pesadíssimo, que a gente tentava levantar.
- Aquela sala irresistível da casa da tia Chiquita, com aqueles bibelôs caros, do mundo todo, que a gente ficava desesperada pra mexer. Lembra daquela tartaruguinha fofa que balançava a cabeça? Acho que você acabou quebrando a cabeça dela, né?
- O sonhado banho de banheira no banheiro azul da casa da Tia Chiquita. Ou era lilás? Sei lá.
- Os cristais que a gente ficava procurando no sítio, em volta da casa. Ou as idas com o papai no pomar, ou na casa do caseiro. A gente super "animada".
- Esquentar água no fogão pra enxaguar a gente na banheira do sítio, passar alfazema no corpo todo pra fugir dos pernilongos, brincar de "comidinha" com terra, barro e grama.
- Voltar do sítio no domingo ouvindo o jogo do Galo (fiquei superfeliz quando ganhei um walkman) e sempre com uma cobra viva no porta-malas, pro papai trocar por soro antiofídico (imagina se ela fugisse da caixa?).
- Atravessar aquela "pinguela" lá no sítio pra nadar no rio e brincar de argila. Ai que medo, mas era tão bom.
- A gente pegando um cabo de vassoura pra desligar a TV, passando mal de pavor daquele filme "Pague para entrar e reze para sair".
- As brincadeiras de stop que sempre acabavam em polêmica... ah nem, não existe carro chamado Zalax, é Galax... ou isso é uma marca de cigarro?! Paaaaiiii !
- As brincadeiras de show dos Beatles na casa da tia Luíza... os meninos eram os astros e a gente só podia ser fã enlouquecida ou segurança, que injusto!
- As brincadeiras na garagem do prédio da tia Luíza, como as corridas naqueles patins que saiam do pé o tempo todo, e que sempre resultavam em machucado.
- Todos aqueles especiais da Globo, A arca de noé, Plunct Plact Zum, que a gente adorava ver.
- Os filmes da sessão da tarde, todos os filmes do Jerry Lewis e do Elvis Presley, acho que a gente viu mil vezes cada um.
- As ondas que a gente fazia na piscina da casa da tia Chiquita com aquelas bóias enormes.
- O dia em que eu comecei a cortar o cabelo da sua barbie noiva e não conseguia parar de cortar, ficou curto e arrepiado e eu ainda passei gel com glitter  e falei que era a última moda. Não adiantou, tive que dar a minha barbie pra você.
- Aqueles comerciais da lux luxo com atrizes famosas que a gente brigava pra ver quem ia ser a Michele Pfifer.
- As brincadeiras com as revistas, avaliando os modelos de roupa, lembra: bonito ou feio!
- As brincadeiras de bonequinha de papel, a gente tinha umas pastas enormes!
- As brincadeiras de papel de carta, as trocas nunca davam certo, sempre alguém saia chorando.
- O dia em que a gente foi na inauguração do parque das mangabeiras e eu subi no brinquedo mais alto e não conseguia descer. Papai subindo lá pra me resgatar e você morrendo de rir.
- Vc aprontando todas, jogando remédio na boca da tia Zezé  que estava dormindo, andando pela casa com as botas da mamãe e levando pontos na testa, e testando as mil vidas do Gustavo.
- Todas aquelas coroações e a cansativa preparação pra elas. O ritual de subir no altar e fazer cara de santa (difícil, né?) só pra ganhar aquelas lembrancinhas com doces no fim!
- O dia em que você deixou sua calcinha cair no clube, quando a gente tava indo pro vestiário, e um cara te chamou pra entregar e você: "ah, é da minha irmã, deixa q eu entrego pra ela". Tudo tem limite, né?
- A primeira vez que a gente andou de escada rolante, na inauguração do BH Shopping. Subir e descer, umas 3 horas direto, ficou todo mundo tonto!
- A gente brincando de bola na varanda lá de casa e a cobra de verdade que apareceu por lá. Todas em pânico, na garagem do prédio, pedindo socorro. Depois, a cobra estirada no meio da rua e os vizinhos saindo pra ver.
- A gente indo no Circo de Moscou, chegando em casa morrendo de medo dos palhaços e do globo da morte, e dormindo todo mundo embolado na cama da mamãe.
- Os bichos que a gente levava pra casa, porquinho da índia (lembra do Dick?), pintinho que virou galo dentro do apartamento (nem lembro como chamava), os peixes que sempre morriam e nem esperavam a gente chegar da escola pra despedir deles.
- Você dando banho no pintinho e o papai secando ele com secador pra ele não morrer!
- Mamãe contando a história dos "pauzinhos perdidos" para gente ficar quieta no carro. A gente chorava até.
- A briga pro papai comprar supra-sumo e chocolate toblerone pra gente quando ele parava em qualquer padaria.
- O dia em que você chapéu do cozinheiro do hotel, na Serra do Cipó, e escondeu dentro da lata de doce-de-leite gigante.
- Eu fabricando a minha própria carteira de identidade, com contact e canetinha (tinha foto 3 x 4 e impressão digital) pra poder sair de noite com o papai e a mamãe.
- Você comendo tatu bolinha no jardim (que nojo) e eu contanto isso pra mamãe, ela horrorizada.
- A gente "experimentando" todas as roupas, maquiagens, jóias e bijouterias da mamãe quando ela saia de casa. Maior bagunça.
- As horas gastas montando a casa da barbie, adaptando os objetos de decoração da sala (mamãe ficava brava demais) e depois de tudo, eu desistindo de brincar, avacalhando a brincadeira toda. "Nossa, o que é essa mão enorme aí atrás de você?".
- A "maratona" que era subir aquela escadaria imensa da casa da tia Chiquita. Parecia que não ia acabar nunca.
- A casa da Dorotéia, o quarto dela com uma cama pra dama de companhia (em que século estávamos mesmo?) e as gelatinas ultra coloridas que a mãe dela fazia e que ninguém comia.
- O papai puto de ter que deixar a gente na esquina quando a gente ia pros bares. "Como esses meninos acham q vcs chegam aqui? Voando?
Mas esse já é outro capítulo...adolescente, né? Vai ficar pro próximo post. Nossa, tanta coisa, passa um filme na nossa cabeça né? Beijo!

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